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O Manifesto dos Frangos


           A alguns anos atrás,quando comecei a trabalhar com saúde pública,mais especificamente na Estratégia de Saúde da Família,eu e o restante da equipe(médico,enfermeiro e auxiliares) nos deslocávamos quilômetros até a sede da equipe,mas  a viagem parecia bem mais longa devido o caminho tortuoso e esburacado.
Bem,mas isso era fichinha quando chegava a hora do almoço(rsrs).Diariamente recebíamos frango(o animal era entregue quase vivo),e daí tínhamos que nos virar para que o amigo frango virasse nosso almoço.E isso já estava me cansando...Era frango todo dia,eu já não agüentava mais.E num belo dia de folga,escrevi o Manifesto dos Frangos.Nada mais justo que os próprios animais torturados,mortos,e comidos,fossem a público e escancarassem o que estava acontecendo.Então,os frangos pediram em nome da vida deles que as nossas vidas fossem também preservadas.Eles estavam ,assim,com
peninha
de nós.No final,questionavam a possibilidade de asas crescerem,e se seria possível os dentistas,médicos e enfermeiros saírem voando da cidade até o posto de apoio da equipe,e se essa era a intenção do prefeito,ou seja,economizar combustível infiltrando asas nos humanos.
    O manifesto nada mais era do que uma grande bobagem que deveria ficar entre nós,profissionais sofredores comedores de frango diários.Mas não,o dito papel com o manifesto foi parar no gabinete do prefeito(estamos lascados,pensei!rsrs).A demissão já era certa!(pensei)! Mas,pasmem,o prefeito resolveu levar tudo na maior brincadeira,e pra nossa alegria,mudou completamente o cardápio de nosso almoço,e assim,salvaram-se muitos,muitos frangos... E o manifesto rodou  nas mãos de anônimos e curiosos,mas nunca souberam quem realmente o escreveu(acho que agora podem saber!rsrs).

Tão distante, Tão próximo



Durante todo o mês de Junho, o consultório odontológico público que trabalho na Estratégia de Saúde da Família passou por sérios problemas de manutenção, e foi,então, que aproveitei os dias que fiquei fora do consultório para me dedicar a uma das comunidades mais carentes dentro da minha área de abrangência da Equipe de Saúde Bucal que integro.
Separada por barreiras geográficas, com um acesso difícil e que foi extremamente dificultado pelas chuvas intensas que banharam essa região por longos dias seguidos. A única ponte de acesso à comunidade havia sido destruída, tivemos,então,que seguir por trilhas no meio de uma estrada com buracos e muita,muita lama... A menos de um ano atrás essa comunidade não sabia o que era ter luz elétrica, essa invenção secular ainda não havia chegado por lá.
A única escola da comunidade, com 78 alunos sempre nos recebeu com muita alegria, e durante cerca de 20 dias pude realizar junto à comunidade a concretização de um trabalho que começou com a realização de oficinas para capacitar os professores da escola para atuarem como multiplicadores do nosso programa de Saúde Bucal na escola; alunos e pais também foram engajados e capacitados. Por fim,relizamos a técnica de Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na própria escola,utilizando o Ionômero de Vidro com sua comprovada eficácia.Também distribúimos escovas e creme dental para todos so alunos que se submeteram à técnica de ART,e a cada dia,antes de cada sessão,eles recebiam instrução de higiene bucal.
Muitos fatos me chamaram a atenção durante todo esse tempo. Da hospitalidae de pessoas tão carentes e que têm muito a oferecer ,até a total falta de descaso para famílias que vivem à margem da sociedade e tão próximas do progresso, da globalização,mas que parecem ter parado no tempo....
Durante a reunião com os pais dos alunos, ouvi de uma das mães o relato de que ninguém na casa dela possuía escova de dente:"Escova de dente na minha casa? È luxo...". Muito complicado, é preciso ter muita cautela para não parecer o "dono da verdade", ou o "cara que veio de fora e acha que tá certo, que pode impor". Saber ouví-los é essencial.Compartilhar o saber é crucial.
Algumas crianças me chamaram a atenção, mas especificamente uma,um garotinho de oito anos de idade,mas que aparenta ter cinco anos. Filho de pais separados, Renato vive com a mãe numa casa simples a alguns quilômetros da escola. A hora do recreio é a alegria de todos, e em especial de Renato, que repete a merenda diversas vezes,três,quatro vezes... Talvez a única refeição do dia.Renato já foi esquecido na escola por sua mãe várias vezes, então as professoras o levam pra casa delas. Incrível como elas se dedicam a eles como se fossem seus filhos. Cecília foi outra que chamou minha atenção. Cecília sofre de degeneração muscular, não faz tratamento e sua situação piora a cada dia. Mas sua mãe a leva a escola com frequência.
Renato e Cecília são apenas alguns exemplos,e suas hitórias não terminam aqui...


amilton


PS.: Os nomes são fictícios.