Que diabo é isso doutor?!?


Muitos pacientes hipocondríacos e "pitiátricos" visitam a Unidade de Saúde da Família à qual trabalho. Toda semana os mesmos rostos se repetem na ânsia de recebrem os mesmos medicamentos,e sempre,quase sempre, são as mesmas reclamações,os mesmos problemas que já se tornaram crônicos na cabeça deles. Muitos já chegaram até o consultório odontológico simplesmente porque estavam querendo aquele "remedinho". E depois de incansáveis minutos tentando esclarecer que remédio somente prescrito na devida necessidade,lá estão eles na outra semana.
Durante esses dias,uma senhora, frequentadora assídua dos corredores da unidade de saúde, levou a filha adolescente para o dentista. Nada foi encontrado ,nenhuma cárie,nada,mas a mãe da paciente relutava e afirmava que algo estava errado com a boca da filha dela. Não podia ser, a filha dela tinha que ter a doença cárie. Fiquei ouvindo ela falar: "Mas doutor, ela tem sim a doença na boca", e olhava pra adolescente e retrucava-"Num é menina, diz ai que tu sente dor na garganta..."- e a adolescente,tadinha, coagida a afirmar que sentia dores na garganta. Daí falei que então ela seria encaminhada para o médico que estava na sala o lado,e então ela disse: "No médico? Não,ele já disse que ela num tem nada,por isso estou com ela aqui porque o senhor vai ver que ela tem problema na boca sim...". Depois de muito conversar com ela, nada adiantava para apagar,deletar da cabeça dela que a filha não tinha nenhum problema físico. Cheguei a pensar,mas não falei ,que quem percisa de tratamento é ela, a mãe e não a adolescente coagida pelos caprichos de uma mãe atormentada pela hiponcria e que tenta repassar os problemas que estão na cabeça dela, a mãe,para a filha. Ela saiu insatisfeita...
No outro dia lá estava ela novamente, com a filha mais nova, reclamando que a garota estava com um caroço na boca e devia ser câncer. Na idade dela,8 anos,bem pouco provável que seja câncer de boca,falei. Ao proceder ao exame clínico encontrei no lábio inferior da garota um pequeno mucocele,provavelmente ocasionado por trauma físico local. Expliquei para a senhora o que significava aquele "carocinho" que já estava a dois meses lá,segundo relato da paciente. Foi feito pequeno procedimento de marsupialização da lesão. No final,nas recomendações, falei à senhora de todos os cuidados pós-operatórios que ela deveria ter com a filha, e atentei para alimentação que deveria ser pastosa naquele dia. Então ela saltou falando: "Pastosa, que diabo é isso doutor? Aonde eu acho esse remédio? Prescreve aí!!". Confesso que fiz esforço grande para não rir na cara dela, e xpliquei que pastosa é o tipo de alimentação,de comida que deveria ser mais líquida e não sólida,dura etc. Ela parece que não gostou muito não,enxerguei no olhar dela uma certa tristeza,talvez porque ela esperasse que pastosa fosse um remédio que ela levaria para casa. E ela saiu levando a filha, faz dois dias e eu ainda não a vi pelos corredores da unidade de saúde.
Mas ela voltará, com certeza voltará...


amilton


1 Response
  1. Kellen Says:

    Remédio com nome de " pastosa"! kkkkkkkk Essa foi boa...
    Ah! Qdo eu estava na graduação tive uma mucocele na mucosa próxima ao lábio inferior. Na época, meu professor de cirurgia resolveu removê-la. Sofri um pouco no pós-operatório, pois os pontos incomodavam naquela região, tanto para falar qto para comer.Mas graças a Deus não houve recidiva!
    Bjs