A Invasão do Consultório


Quantos caminhos podemos seguir sem sair da rota traçada?
Quantos personagens personificamos diariamente?
Qual o nível de lucidez aceitável?
E o que é normal?
Muitas perguntas podem ser levantadas, poucas respostas poderão ser colocadas diante de nossas incansáveis dúvidas, que muitas vezes nos deixam extasiados no meio do caminho. Muitas vezes sofremos com inúmeras dúvidas, com medos que não nos levarão a lugar nenhum, a não ser percorrer rotas mais longas, caminhos mais tortuosos. No final, poderemos chegar marcados com "manchas" de insensatez, de vazios que não foram preenchidos, de tempos que foram inutilmente perdidos...
Já falei algumas vezes sobre loucura, e inúmeros pacientes já "surtaram" na minha frente, já me colocaram em situações das mais inusitadas. Incrível como ,muitas vezes, a imagem não quer dizer simplesmente nada,absolutamente nada, e realmente o que importa é o conteúdo.
Há cerca de vinte dias atrás, um rapaz de aproximadamente 28 anos, que já havia sido atendido no consultório e que sempre o víamos como uma pessoa "normal",invadiu o consultório numa noite de sexta-feira. Pois é, ele chegou extremamente alterado, foi lgo entrando, empurrando a mãe de uma pequena paciente que estava sendo atendida. Por sorte ele me encontrou num dia em que eu estava numa paz tremenda, numa calma franciscana. E ele foi logo gritando,falando que eu tinha que atendê-lo etc etc. Olhei pra ele calmamente, confesso que ele me assustou um pouco, os olhos dele diziam muito, não parecia ser a mesma pessoa que conhecíamos, literalmente parecia se tratar de outra pessoa.O ódio estava estampado na cara dele. Falei que poderia atendê-lo,mas somente após todos os outros pacientes serem atendidos, então eu o atenderia. Ele saiu,e a mãe da paciente já assustada, a criança começou a chorar desesperadamente, gritava,gritava, e a auxiliar já cogitou a possibilidade de ligar pra polícia,mas falei que não, não precisaria.Porém,minutos depois ele retorna, mais alterado ainda e nos ameaçou dizendo que teríamos que atendê-lo e saiu batendo a porta com uma força descomunal. Dessa vez fiquei nervoso,mas agora agradeço por ele não ter ficado no consultório, e ter saído correndo, não sei o que aconteceria,pois eu já tinha perdido minha "santa" paciência.
Terminamos de atender todos os pacientes e resolvemos ir até a delegacia fazer um boletim de ocorrência, e ao chegar lá descobrimos através do escrivão que o rapaz já tinha três processos contra ele,todos por agressão. Eu e a auxiliar ficamos imaginando mil coisas que poderiam ter acontecido momentos antes no consultório...
Mas o pior veio no dia seguinte, quando ao encontrar casualmente com o escrivão na rua ele me falou que o rapaz tinha sido preso na noite anterior, não por ter invadido o consultório,mas porque ao sair do consultório ele entrou numa igreja evangélica e quebrou tudo,tudo mesmo. Fiquei mais assustado ainda, e pensando que talvez a intenção dele era quebrar todo o consultório, mas como nem eu e nem a auxiliar reagimos ele saiu e foi quebrar a igreja evangélica mais próxima.
Só agora estou contando tudo isso que aconteceu numa sexta-feira, dia 5 de Junho, porque o delegado me ligou perguntando se eu gostaria de levar o processo a frente, e por coincidência cruzei com o rapaz a alguns minutos atrás, e ele parecia outra pessoa, deu bom dia e tudo e saiu sorrindo com a cara mais cínica do mundo. Daí não sei se ele é louco mesmo ,se estava com um baita de um problema, se costuma "surtar" frequentemente. Sinceramente não sei, só sei que o que ele fez não foi correto, e ainda estou na dúvida se levo o processo a frente ou não. Agora penso que ele já ficou preso uma noite, que ele precisa mesmo é de tratamento, de ajuda, e por isso não vou querer ficar frente a frente com ele num tribunal. Espero que ele não vista mais a máscara de um personagem distorcido da realidade e venha me perturbar em plena sexta-feira a noite... Não,numa sexta-feira a noite não, não é justo.

amilton
1 Response
  1. Kellen Says:

    Nossa Amilton!
    Que dúvida cruel...
    Assim como vc acho q ele precisa é de ajuda psiquiátrica!
    Graças a Deus ele não quebrou nada no consultório e nem agrediu vcs fisicamente.
    Bjs e Cuide-se!