Aos 88...


Numa manhã chuvosa, pouco fora das atividades normais de um consultório público, um senhor de 88 anos chamou minha atenção. Aparentando cansaço e dor, ele chegou à procura de atendimento odontológico, a dor o incomodava a dias, até que decidiu, depois de 88 anos ir ao dentista. Para a citada ocasião, a melhor roupa, o melhor calçado, tudo muito bem ,se não fosse a dor que só crescia mais e mais. Questionado por nunca ter ido ao dentista, a resposta foi curta e rápida: "-Eu nunca tive a oportunidade..." Foi justamente aí que parei pra pensar quantos senhores e senhoras ainda existem em nosso país que são marginalizados, que mascaram suas dores e são excluídos pelo sistema. Somos os campeões mundiais em faculdades de odontologia, por outro lado temos os maiores índices de desdentados do mundo. Um antagonismo paradoxal.
Depois de anos com políticas meramente exclusivistas e excludentes, nosso país caminha para a tentativa de mudar um quadro epidemiológico traumático e desgastante socialmente,ou seja, trabalhar o lado social e humanizado da saúde, tentar evitar, prevenir, mas também dá assistência curativa a quem sente dor e tem inúmeros problemas. Um longo caminho a se percorrer, mas sou otimista. Se cada um fizer a sua parte chegaremos a obter bons resultados.
A primeira vez ao dentista aos 88 anos de vida pode parecer um absurdo, mas infelizmente situações como essa são comuns na vida diária do nosso Sistema Único de Saúde (SUS), modelo de atenção primordial e exemplar, mas distorcido e muitas vezes não colocado em prática na sua real necessidade.
Que surjam cada vez mais políticas voltadas para o idoso, não somente medidas assistencialistas que se baseiam em programas que não mostram resultados eficazes,mas propostas verdadeiramente humanas de inclusão social, de valorização,e não de tratamento do idoso como um "retardado", mas como alguém que ainda tem muito a nos ensinar.
Que a primeira vez chegue mais cedo e que aos 88, aos 98, aos 108 anos possamos dar belos sorrisos.
Abraços
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